Brasil

Lideranças indígenas recebem prêmios internacionais pela luta por direitos humanos

Sonia Guajajara e Alessandra Korap denunciam invasão de territórios protegidos e protestam contra inércia do governo federal
Sonia Guajajara: ativista organizou jornada indígena que passou por 12 países europeus em 2019 Foto: Gabriel Monteiro/4-6-2019
Sonia Guajajara: ativista organizou jornada indígena que passou por 12 países europeus em 2019 Foto: Gabriel Monteiro/4-6-2019

RIO — Duas lideranças indígenas brasileiras venceram prêmios internacionais ligados à luta pelos direitos humanos. Sônia Guajajara e Alessandra Korap foram reconhecidas pelas denúncias a atividades ilegais em áreas protegidas — que, segundo elas, são respaldadas pelo discurso anti-ambientalista do governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido).

Sônia Guajajara recebeu esta quinta-feira o Prêmio Letelier-Moffitt de Direitos Humanos em nome da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), entidade que coordena. Seu trabalho foi reconhecido após organizar a jornada "Sangue Indígena: Nenhuma Gota a Mais", que passou por 12 países europeus entre outubro e novembro do ano passado.

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Sediada em Washington, a Fundação  Letelier-Moffitt leva este nome em homenagem a Orlando Letelier e Ronni Moffitt, ativistas de direitos humanos mortos em 1976 na capital americana por agentes do serviço secreto chileno. A primeira edição do prêmio ocorreu dois anos depois.

Representantes brasileiros já conquistaram duas vezes a premiação — em 1982, a láurea foi conquistada ao cardeal Paulo Evaristo Arns. E, em 1989, à União das Nações Indígenas (UNI).

Na próxima quinta-feira, a líder indígena Alessandra Korap receberá o Prêmio Robert F. Kennedy de Direitos Humanos. Natural da Terra Indígena Praia do Índio, no Pará, onde vivem cerca de 14 mil mundurukus, sua etnia, Korap notabilizou-se denunciar na Câmara dos Deputados uma série de ações ilegais em territórios indígenas.

O Prêmio Robert F. Kennedy dado há 37 anos para "campeões excepcionais de coragem moral que resistem à opressão, mesmo com grande risco pessoal, na busca não violenta dos direitos humano", como define em um comunicado. Korap já teve a casa invadida e recebe ameaças de morte por telefone.

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— Estou escondida, sou vista como uma ameaça, sou incomodada — revela Korap. — Não quero ser morta antes de as pessoas me ouvirem. Meu filho já me abraçou e disse: "Mãe, não quero que te matem". Preciso falar agora, urgentemente.

Korap, no entanto, considera que a sociedade brasileira ainda é "surda" em relação aos apelos dos indígenas. Sua mobilização fora da aldeia munduruku começou há cerca de cinco anos, mas no começo, tinha acesso vetado aos debates por ser mulher.

— Fui acompanhar os caciques, mas muitas vezes era barrada em encontros com políticos, como prefeitos e vereadores. Os pedidos de socorro que faço não são só meus. São de vários povos que tiveram a demarcação de suas terras vetada pela Funai, ou que convivem com mineradores e plantadores de soja contaminando os seus rios. Várias invasões estão acontecendo, há territórios indígenas que parecem cidades de garimpeiros.

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Korap, no ano passado, participou de uma comitiva que reuniu-se com o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), onde fez críticas ao governo federal e à eventual retirada da Funai do Ministério da Justiça.

A líder indígena elogia o reconhecimento internacional à sua luta, mas avalia que "boa parte" da devastação do meio ambiente do Brasil tem ligação com negócios dos países desenvolvidos.

— Quem financia o mercúrio da Amazônia, quem compra carne e soja? — questiona Korap, que acredita que a classe política também tem interesse na destruição do patrimônio ambiental. — Nossos direitos são massacrados pelo presidente, por ministérios, por deputados e senadores. Os homens brancos não beberão a água suja pela barragem e pelo petróleo.