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Economia

De laptop a aspirador de pó, venda de eletrônicos dispara na quarentena

Apesar da crise gerada pela pandemia, fabricantes mantém lançamento de novos produtos e surfam demanda estimulada por 'home office'
Demanda em alta. Segurança mede temperatura de cliente na porta de uma loja da Apple em Charleston, nos EUA Foto: Sean Rayford / AFP
Demanda em alta. Segurança mede temperatura de cliente na porta de uma loja da Apple em Charleston, nos EUA Foto: Sean Rayford / AFP

RIO - Com o isolamento dos que podem ficar em casa para conter o coronavírus e mais profissionais trabalhando em home office , as vendas de eletrônicos entraram na contramão da crise econômica gerada pela pandemia.

Enquanto produtores de bens não essenciais como calçados e vestuário pisaram no freio com a maior parte do comércio fechado, fabricantes de computadores, celulares, TVs e eletrodomésticos mantiveram os lançamentos para evitar prejuízos e acabaram surfando a alta na demanda dos confinados.

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Segundo especialistas, num setor que programa novidades com muita antecedência, adiar o que já estava programado desde o ano passado significa prejuízo alto e o risco de ficar para trás na corrida tecnológica.

Levantamento feito pelo GLOBO identificou ao menos 80 novos produtos lançados neste segmento desde março, quando a pandemia começou e aumentaram as vendas via comércio eletrônico.

Com a adoção do trabalho em casa por muitas empresas e a troca de aulas presenciais em escolas e universidades por atividades on-line, muita gente que não tinha os equipamentos adequados foi às compras.

Segundo a consultoria GFK, a venda de notebooks cresceu 173% desde março. A de tablets, 176%. Muitos aproveitaram para equipar a casa também para o lazer e ganhar uma mãozinha nas tarefas domésticas. A venda de TVs e celulares, que estavam em queda antes da pandemia, subiram 126% e 125%, respectivamente. Aspiradores de pó viraram uma nova febre: alta de 351%.

Melhor arriscar que adiar

Segundo Reinaldo Sakis, gerente de pesquisa de consumo da consultoria IDC Brasil, é muito caro para as empresas suspender o desenvolvimento de produtos, processo que leva de seis a 12 meses antes de chegar ao mercado. É melhor correr o risco e se manter na vanguarda tecnológica, diz:

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— Ficar parado agora e retomar o investimento depois da crise é mais custoso. Ainda pode atrapalhar o cronograma de lançamentos do ano seguinte.

O aspirador de pó da Samsung: esse tipo de aparelho se tornou um dos campeões de vendas da pandemia Foto: Divulgação
O aspirador de pó da Samsung: esse tipo de aparelho se tornou um dos campeões de vendas da pandemia Foto: Divulgação

A americana Apple já lançou dois laptops, um tablet e um smartphone desde o início da pandemia. A proposta do novo iPhone SE, uma atualização de um modelo antigo com preço (R$ 3.699) mais baixo que os de ponta de sua linha, casou com o momento de crise econômica.

A estratégia vem com a expansão dos serviços da Apple a mais de 50 países. No mês passado, o presidente da empresa, Tim Cook, indicou acreditar que, mesmo com dinheiro curto, consumidores vão continuar investindo em eletrônicos.

Disse que, apesar do impacto global sem precedentes do coronavírus, as pessoas precisam se manter conectadas e produtivas. Por isso, a Apple continua “atendendo a essas necessidades de maneiras diferentes”.

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Agora, com a abertura gradual das lojas da Apple nos EUA, a empresa tem novidades para receber os clientes, observam os especialistas. Em várias lojas americanas reabertas, medidas de distanciamento social e medição de temperatura corporal na entrada não afastaram consumidores.

A Apple se prepara para apresentar sua nova geração de iPhones em setembro, como ocorre todos os anos. E não cogitou adiar o evento até agora, mesmo se a pandemia perdurar.

O iPhone SE, novo lançamento da Apple: novidade com preço mais baixo que modelos top de linha Foto: Divulgação
O iPhone SE, novo lançamento da Apple: novidade com preço mais baixo que modelos top de linha Foto: Divulgação

A LG prepara mais de 30 lançamentos para este ano, mesmo patamar de 2019, diz o vice-presidente de vendas da marca, Roberto Barboza:

— Se você perde um semestre, alguém vem e você perde a novidade tecnológica. Depois que você cria um calendário, é difícil voltar atrás. Além disso, o varejo foi buscar novas formas de vendas. As vendas foram boas em março e no dia Das Mães — diz Barboza, referindo-se ao forte crescimento do comércio eletrônico.

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A Samsung também lançou celulares nos últimos dois meses e apresentou novidades em outros segmentos. Na semana passada, a companhia apresentou três modelos de aspirador de pó vertical sem fio, estreando nessa área.

Roteador do multilaser: ao lado dos laptops, aparelhos para conexão wi-fi ficaram mais procurados com home office e aulas on-line impostos por quarentena Foto: Divulgação
Roteador do multilaser: ao lado dos laptops, aparelhos para conexão wi-fi ficaram mais procurados com home office e aulas on-line impostos por quarentena Foto: Divulgação

Além disso, trouxe recentemente o aspirador de pó robô — controlado pelo celular em vez de conduzido pelo usuário pela casa — ao mercado brasileiro.

— Com as pessoas em casa, percebemos crescimento na procura por produtos que facilitam as tarefas do dia a dia — diz Helbert Oliveira, diretor de linha branca da Samsung.

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A busca por aspirador foi tanta que a Multilaser viu seu estoque se esgotar pouco tempo após o lançamento de seu modelo robô, em março, no início da quarentena. Segundo Flavia Bordin, gerente de produto da Multilaser, a produção foi prejudicada pelo fechamento de fábricas de componentes na China pela pandemia.

Neste mês, a empresa lança uma linha com soluções para casas conectadas, como lâmpadas inteligentes, fechaduras biométricas e sensores.

Segundo Bruno Gouvea, diretor da empresa, o consumidor nessa crise  busca produtos com custo-benefício:

— Nossa estratégia é trazer produtos com preços acessíveis. E isso vem se mostrando bem acertado na crise. As pessoas estão em casa o tempo todo e agora estão buscando produtos que aumentem sua segurança.

— Na crise, o consumidor vai na marca na qual tem mais confiança. Depois da fase de comprar alimentos, passou a investir mais em equipamentos para trabalhar em casa e aumentar seu conforto — diz Fernando Baialuna, diretor de Varejo da GFK.

O Grupo Britânia, dona da marca Philco,  mesmo com a quarentena, fez a estreia no segmento de celular com a marca Philco Hit. Cristiane Clausen, diretora-excutiva Grupo Britânia, lembra que foram cerca de 50 lançamentos desde março, lista que inclui televisores, tablets, fones de ouvidos, robô de limpeza e até refrigerador inteligente.

— Estamos a todos vapor. A gente acredita que vai melhorar. Muita coisa já estava prevista. Vemos hoje um potencial de crescimento com o e-commerce e os hipermercados. O varejo está se reinventando, vendendo no WhatsApp e com delivery. As pessoas estão em casa e precisam de conectar mais, se entreter. Não lançar nada é pior. Já estamos planejando o lançamento de novos celulares para o segundo semestre — disse ela, destacando que a empresa planeja em um ano nacionalizar a produção de celular em sua fábrica em Manaus.

A Asus decidiu manter o lançamento de sua linha de notebooks ao verificar um aumento de até 80% nas buscas por novos produtos na internet. Para Fabio Faria, gerente de Marketing da empresa, o home office vem estimulando as vendas na categoria.

— Apesar dos desafios com as lojas fechadas e do impacto com a entrega em algumas peças, teremos mais lançamentos nas próximas semanas. Queremos manter a normalidade — disse Faria.

A Positivo decidiu antecipar o lançamento de notebooks da marca Vaio, prevista originalmente para meados de junho. A decisão foi tomada após a corrida de consumidores por novos produtos a hipermercados e em sites de varejo. Para isso, a empresa passou a contratar frete aéreo, mais caro em relação ao marinho, para trazer componentes da China, diz  Samuel Rodegheri, diretor de produtos da Positivo Tecnologia.

— Houve um aumento de 20% nas vendas desde a pandemia. O próprio varejo aumentou os seus estoques.

José Cardoso, presidente da Motorola, explicou que aumentou os investimentos para  a área digital, com a melhoria da experiência de navegação móvel na compra dos produtos da loja online da marca e na criação de um site  exclusivo para pequenas e médias empresas.

— Toda a tecnologia móvel ganha importância ainda maior no momento em que as pessoas estão atuando em regime de home office. O smartphone permite inclusive a possibilidade de continuarem oferecendo seus serviços, como psicólogos e terapeutas e toda a cadeia de alimentação através dos aplicativos de delivery.